A Reforma do Judiciário

Luiz Fernando Valladão Nogueira

Com o advento da Emenda Constitucional 45, de 08 de Dezembro de 2004, a tratar da chamada “Reforma do Judiciário”, criou-se expectativas não só aos jurisdicionados, mas a todos os “personagens” do processo, ou seja, Magistrados, Advogados, Representantes do Ministério Público, etc…
A expectativa começa com a “garantia fundamental”, de que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (art. 5º. LXXVIII CF).
Esta garantia é reforçada ao final da Emenda Constitucional, ao estabelecer o seu art. 7º. que, “em cento e oitenta dias” , uma “comissão especial” deverá elaborar “os projetos de lei necessários à regulamentação da matéria nela tratada, bem como promover alterações na legislação federal objetivando tornar mais amplo o acesso à Justiça e mais célere a prestação jurisdicional”.
Será que o horizonte que se vislumbra, seja no campo constitucional, seja nas normas infraconstitucionais que advirão, faz que a expectativa criada se transforme numa certeza de justiça célere e acessível ?
Parece-me que, excetuando algumas novidades de praticidade inegável, a reforma que se está implementando não trará celeridade e acesso, com qualidade.
Sim, é certo que a súmula vinculante, com relação à Administração Pública, poderá trazer uma mudança de critérios por parte de nossos governantes. De fato, esta novidade deverá fazer com que o Administrador Público deixe de protelar com o cumprimento de decisões judiciais, e, mais do que isto, poderá fazer com que ele não institua ou cobre tributos, que foram tidos como inconstitucionais pelo STF.
Todavia, não se revela útil o “terrorismo”, que se está por fazer, em torno da utilidade do processo, e dos mecanismos que lhe garantem efetividade e segurança.
Poderia ser razoável a proposta de incidência de honorários sucumbenciais, a cada recurso perdido pela parte. Quem sabe tal situação inibira recursos protelatórios!
Todavia, deixa de existir esta razoabilidade, a partir do instante em que se junta a este critério a proposta de uma regra geral de efeito devolutivo às apelações, bem como a ressuscitação da malfada argüição de relevância, como pressuposto ao conhecimento de recursos especial e extraordinário.
Ora, há diversos temas que estão sendo pacificados pela jurisprudência, notadamente por aquela que advém do ainda jovemSuperior Tribunal de Justiça. Daí porque não convém esta exagerada inibição ao sagrado direito da parte, em ver questionada a decisão judicial que lhe é adversa. O apenamento pela litigância de má-fé, incluindo-se aí a interposição de“recurso com intuito manifestamente protelatório” (art. 17 VII CPC), já tem previsão e é remédio útil que deveria ser mais utilizado.
O duplo grau de jurisdição é garantia, que reputo também constitucional (art. 5º. LV CF – garantia da “ampla defesa”, “com os meios e recursos a ela inerentes”). Daí porque este acúmulo de medidas inibidoras ao acesso aos recursos, a par de revelar um exagero inexplicável, trairá os propósitos da própria Emenda Constitucional aqui já apontada, de propiciar uma justiça acessível.
Grave, de outro lado, é a tentativa de dar-se poderes processuais aos magistrados, em decorrência de alteração no par. único do art. 14 do CPC, para que possam punir o advogado com multa em até 20% sobre o valor da causa.
Qualquer censura ao advogado, que goza da imunidade profissional assegurada pela Constituição Federal (art. 133 CF), não se revela atentatória só à autonomia profissional e ao princípio de que não há hierarquia entre juízes e magistrados. Muito mais do que isto, tal pretensão de alteração legal atenta aos interesses do cidadão, que, ao ir a juízo, pretende que seu advogado o represente com liberdade e altivez, sem receio de desagradar a qualquer autoridade.
Há excessos sim, e quanto a isto não tenho dúvida alguma ! Porém, estes excessos, como afiança a atual redação do precitado par. único do art. 14 CPC, devem ser coibidos e punidos pela OAB, não por razões corporativistas, mas para que oCIDADÃO possa, realmente, como se prometeu na Emenda Constitucional da “Reforma do Judiciário”, ter um acesso livre ao judiciário, através de um processo em que o ADVOGADO, seu representante, não fique limitado.
Por certo que a sociedade fiscalizará estas proposições, de tal forma a não deixar que uma falsa propaganda diminua um pouco mais a sensação de cidadania que gostamos de sentir.