Alimentos entre Colaterais

Luiz Fernando Valladão, Advogado, Professor Universitário e Coordenador e coautor do Livro “Paternidade e Alimentos” (ed. Del Rey).

Pablo de Souza Assis, Advogado e coautor do Livro “Paternidade e Alimentos” (ed. Del Rey).

1 INTRODUÇÃO

O art. 1.694 do Código Civil de 2002 (CC) dispõe que os parentes, os cônjuges ou companheiros podem “pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”.

Assim, é dada ao necessitado a faculdade de demandar judicialmente seu parente, pretendendo o recebimento de pensão alimentícia para auxiliar no custeio da sua própria mantença, devendo ser observada a ordem de sucessão prevista no art. 1.697 CC.

O legislador, ainda que de maneira descuidada, buscou uniformizar este procedimento, trazendo no art. 1.698 do CC uma característica indubitavelmente processual. Eis a literalidade da citada norma:

Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.

Surgem, nesse contexto, algumas dúvidas acerca de aspectos de direito material e processual, no tocante aos alimentos entre colaterais.

A intenção deste trabalho é oferecer uma visão panorâmica e atual sobre a extensão subjetiva da obrigação alimentar em razão do vínculo de parentesco entre colaterais, observada a ordem de preferência taxativamente disposta no art. 1.697 do Código Civil. De igual forma, este trabalho pretende debater sobre o caminho processual a ser seguido, quanto ao chamamento daqueles obrigados à prestação alimentar (art. 1698 CC in fine).
2 OBRIGAÇÃO ALIMENTAR ENTRE COLATERAIS
Não é demais lembrar que a obrigação de prestar alimentos está ligada, a teor da Constituição Federal de 1988, à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e à solidariedade social e familiar (art. 3º).

Na lição de Clóvis Beviláqua “a palavra alimentos tem, em direito, uma acepção técnica, de mais larga extensão do que na linguagem comum, pois compreende o que é necessário à vida: sustento, habitação, roupa e tratamento de moléstias”.

Enquanto isso, destaca Silvio de Salvo Venosa, que:

O Código Civil, no capítulo específico (arts. 1.694 a 1.710), não se preocupou em definir o que se entende por alimentos. Porém, no art. 1.920 encontramos o conteúdo legal de alimentos quando a lei refere-se ao legado: “o legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o vestuário e a casa, enquanto o legatário viver, além da educação, se ele for menor”.  

Noutra arena, cumpre ainda registrar, ante a pertinência de suas observações, a advertência de Maria Helena Diniz, ao afirmar que “não se deve confundir a obrigação de prestar alimentos com os deveres familiares de sustento, assistência e socorro que tem o marido em relação à mulher e vice-versa e os pais para com os filhos menores, devido ao poder familiar, pois seus pressupostos são diferentes”.

Assim sendo, nota-se que os deveres de mútua assistência imposta aos cônjuges e aqueles imputados exclusivamente aos pais para com os filhos – artigo 1.566 do Código Civil – não guardam relação com a obrigação alimentar insculpida nos termos do artigo 1.694. Enquanto aqueles decorrem do dever familiar, esta tem por fundamento a relação de parentesco, do casamento e da união estável, e se estende, inclusive, para além daquelas pessoas alcançadas pelos deveres familiares de sustento, assistência e socorro:

 

art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

A esse respeito, leciona Carlos Roberto Gonçalves, que:

Entre pais e filhos menores, cônjuges e companheiros não existe propriamente obrigação alimentar, mas dever familiar; respectivamente de sustento e de mútua assistência (CC, arts. 1.566, III e IV, e 1.724). A obrigação alimentar também decorre da lei, mas é fundada no parentesco (art. 1.694), ficando circunscrita aos ascendentes, descendestes e colaterais até o segundo grau, com reciprocidade, tendo por fundamento o princípio da solidariedade familiar. 

Em suma, não podemos, realmente, confundir a obrigação de prestar alimentos decorrentes do casamento, da união estável e da relação de parentesco, com os deveres familiares de sustento, assistência e socorro, que devem ser atendidos incondicionalmente, em razão da solidariedade humana e econômica fincada no seio familiar. Aquela, diferente destes deveres, é recíproca, depende da possibilidade econômico-financeira contributiva do obrigado e somente se torna exigível se o credor potencial estiver realmente necessitando do alegado, ou seja, “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada” – § 1º, artigo 1.694 do Código Civil.

Além disso, não é ocioso lembrar que a prestação alimentícia é uma relação jurídica de natureza continuada, e, portanto, não se caracteriza pela imutabilidade da coisa julgada, o que permite sua revisão a qualquer tempo, desde que alterada a possibilidade econômico-financeira do alimentante ou a real necessidade do alimentando.

Com efeito, estampada a moldura, pelo artigo 1.694 do Código Civil, das pessoas obrigadas a prestarem alimentos, coube aos artigos 1696 e 1697, por sua vez, fixarem a ordem de preferência e os limites subjetivos da obrigação alimentar. E, nesse particular, reza o primeiro dispositivo legal que “o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros”; enquanto isso preconiza o segundo mecanismo que “na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais”.

Nota-se aqui que os cônjuges ou companheiros não se encontram relacionados nessa ordem sucessiva, uma vez que estes só devem alimentos uns aos outros em circunstâncias especiais, ou seja, o fundamento da obrigação recíproca de prestar alimentos entre eles é a dissolução da sociedade conjugal ou união estável, o que antes se consubstanciava no dever de mútua assistência, conforme dantes ventilado.

Porém, infere-se dos dispositivos acima transcritos que há uma ordem de preferência intrínseca na linha reta entre ascendentes e descendentes; e outra extrínseca entre a linha reta para com a colateral na prestação de alimentos, ou seja, uma vez esgotada a possibilidade de sê-los prestados pelos ascendentes, recai sobre os descendentes, para, só então, na falta destes, obrigar subsidiariamente os colaterais até segundo grau, sejam irmãos germanos (filhos do mesmo pai e da mesma mãe) ou unilaterais (filhos de um mesmo pai ou de uma mesma mãe). O que não implica dizer que a responsabilidade dos colaterais seja remota, haja vista que, no caso de ausência ou impossibilidade econômico-financeira contributiva dos coobrigados na linha reta, respondem indistintamente os colaterais até segundo grau, assim germanos como unilaterais.

Lado outro, embora o artigo 1.697 tenha atribuído a responsabilidade de prestar alimentos aos colaterais até segundo grau, nota-se, ainda, que o Código Civil, ao tratar, no Livro IV, das relações de parentesco, consagrou no seu artigo 1.592 que também “são parentes na linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra”; enquanto que no artigo 1.591 lançou que “são parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes.

Em outras palavras, o parentesco decorre do vínculo existente entre uma pessoa e o tronco ancestral em comum. Observando-se a relação de ascendência e descendência entre os parentes, teremos o parentesco em linha reta. Sem essa relação, mas levando em consideração a ancestralidade em comum, teremos o parentesco na linha colateral:

A despeito da sistematização delineada, pelo legislador, no Código Civil, ao tratar das relações de parentesco na linha colateral ou transversal até o quarto grau – artigo 1.592, não se afigura correto interpretar que a obrigação de prestar alimentos dos colaterais se estende para além daquelas pessoas obrigadas no artigo 1.697, haja vista que este dispositivo não inclui qualquer outra classe de parentes, senão aquelas ali retratadas, quer na linha reta ou quer na linha colateral.
Noutro giro, não se pode ignorar a dissonância entre o Direito Sucessório e a obrigação de prestar alimentos dos colaterais. Enquanto esta se estende tão-somente aos parentes colaterais até o segundo grau – artigo 1.697, na sucessão hereditária, observada a preferência discriminada no artigo 1.829, os colaterais até quarto grau são agraciados por inteligência dos artigos 1.829, IV e 1.839, ambos do Código Civil.

Asseverou a Desembargadora Maria Berenice Dias, ao discorrer sobre aludidas normas, que:

O simples fato de a lei trazer algumas explicitações quanto à obrigação entre os parentes ascendentes e descendentes, bem como detalhar a obrigação dos irmãos, não possibilita afirmar tenha excluído os demais parentes da obrigação alimentar indicados no art. 1.694. Simplesmente não viu o legislador necessidade de qualquer detalhamento sobre a obrigação dos parentes de terceiro e quarto grau, o que, às claras, não significa que os tenha dispensado do dever alimentar. Os encargos alimentares seguem os preceitos gerais. Na falta dos parentes mais próximos são chamados os mais remotos, começando pelos ascendentes, seguidos dos descendentes. Portanto, na falta de pais, avós e irmãos, a obrigação passa aos tios, tios-avós, depois aos sobrinhos, sobrinhos-netos e, finalmente, aos primos.
Se esta não fosse a intenção do legislador, o art. 1.694 simplesmente diria: Podem os parentes, até o segundo grau, (…) pedir alimentos uns aos outros.
De outro lado, não há como reconhecer direitos aos parentes e não lhes atribuir deveres. Cabe figurar um exemplo: dispondo de patrimônio, mas não de condições de prover a própria subsistência, alguém que não tenha pais, filhos ou irmãos não poderia pedir alimentos aos demais parentes, ou seja, tios, sobrinhos ou primos. Vindo o desafortunado a morrer de fome, seus bens seriam entregues exatamente aos parentes que não lhe alcançaram, por falta de aparente dever legal, alimentos. 
Em que pese o perfil humanitário que é tão peculiar à Desembargadora, a maioria da doutrina e dos tribunais pátrios, apegados às disposições legais, consideram que o Código Civil, embora tenha previsto o vínculo de parentesco colateral até o 4º grau, estabeleceu taxativamente, ao dispor sobre a obrigação alimentar colateral, que esta não ultrapassará o segundo grau – artigo 1.697.

Ante a pertinência de suas observações, merece destaque a clássica decisão do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, quando do julgamento do HC 12.079/BA, DJ de 16/10/2000, e que se mantém como um dos principais precedentes sobre a matéria:

Processo HC 12079 / BA ; HABEAS CORPUS 2000/0009738-1. Relator(a) Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA (1088). Órgão Julgador T4 – QUARTA TURMA. Data do Julgamento: 12/09/2000. Data da Publicação/Fonte: DJ 16.10.2000 p. 312. JBCC vol. 185 p. 446. RBDF vol. 8 p. 112. RT vol. 786 p. 215. Ementa: HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS. TIOS E SOBRINHOS. DESOBRIGAÇÃO. DOUTRINA. ORDEM CONCEDIDA. I – A obrigação alimentar decorre da lei, que indica os parentes obrigados de forma taxativa e não enunciativa, sendo devidos os alimentos, reciprocamente, pelos pais, filhos, ascendentes, descendentes e colaterais até o segundo grau, não abrangendo, conseqüentemente, tios e sobrinhos. II – O habeas corpus, como garantia constitucional contra a ofensa à liberdade individual, não se presta à discussão do mérito da ação de alimentos, que tramita pelas vias ordinárias, observando o duplo grau de jurisdição. III – Posicionando-se a maioria doutrinária no sentido do descabimento da obrigação alimentar de tio em relação ao sobrinho, é de afastar-se a prisão do paciente, sem prejuízo do prosseguimento da ação de alimentos e de eventual execução dos valores objeto da condenação.
Assim sendo, a obrigação alimentar pressupõe a existência de um vínculo jurídico entre o credor e o devedor e para tal devemos utilizar como parâmetro o artigo 1.697 do Código Civil, ao dispor com clareza que, na falta de ascendentes e descendentes, a obrigação alimentar é estendida somente aos irmãos, tanto aos germanos quanto aos unilaterais, porém nos limites da gradação instituída pelo ordenamento cível, devendo primeiramente a obrigação se estabelecer entre o alimentando e seus ascendentes, a seguir com seus descendentes e, apenas na falta destes, ser-lhe-á facultado exigi-la de seus parentes colaterais até segundo grau, entre os quais não há uma ordem de preferência, uma vez que o legislador não estabeleceu qualquer diferença ou distinção entre as espécies de irmãos germanos ou unilaterais, sendo desprovida de qualquer amparo a tese da subsidiariedade da obrigação alimentar entre os irmãos, na qual os germanos antecederiam os unilaterais.

Para elucidar ainda mais as ideias até então traçadas, lançamos mão de fragmentos das razões de decidir proferidas no voto do Desembargador Caetano Levi Lopes:

[…] É bem verdade que o art. 1698 do Código Civil em vigor adotou, também, o mencionado princípio da solidariedade familiar ao dispor que o credor dos alimentos pode chamar os parentes de grau imediato se os do grau antecedente não tiverem condições para suportar integralmente o encargo.
Todavia, não se pode emprestar à norma interpretação extensiva, na medida em que tem caráter nitidamente excepcional. Assim, força é entender que a chamada somente pode ocorrer dentro da mesma linha. E tanto é verdade que, na linha colateral, a obrigação legal é limitada ao segundo grau, ou seja, não existe graus imediato obrigado.
Dessa forma, nota-se que a preferência dos mais próximos em grau, prevista na inteligência do artigo 1.697, não deixa de ser observada. Porém, não se pode negar que a redação empregada no artigo 1.698 do Código Civil, orientado pelo princípio da solidariedade familiar, trouxe para o texto legal o que a jurisprudência já vinha admitindo, o pensionamento complementar:

Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada a ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.
Francisco José Cahali, ao discorrer sobre as inovações trazidas pelo então “Novo Código Civil”, ponderou que:

Uma outra novidade no texto legal, embora a jurisprudência já admitisse a interpretação do sistema atual nesse sentido, é a previsão contida no artigo 1698 consistente na pensão supletiva, na pensão complementar.
É aquela situação em que o pai não tem condições de cobrir todas as despesas do filho. Daí, o filho entra com a ação contra os avós. Existe essa possibilidade hoje? Não prevista em lei. A lei atual fala: a obrigação é sempre de acordo com o parentesco: o mais próximo responde em primeiro lugar pela obrigação. Não fala na complementação. Levaria a entender que só na falta do mais próximo ou incapacidade do mais próximo, poderia ir atrás do mais remoto. Mas a jurisprudência já admite essa pensão complementar.
Então, andou bem o Código em trazer essa novidade no aspecto legislativo. Permite a pensão complementar. E também fala que é sempre na proporção dos recursos de cada um. 
Pelos fatores apresentados, a obrigação alimentar estabelece um vínculo de solidariedade e reciprocidade que liga os parentes unindo-os, de modo que todos são, ao mesmo tempo, obrigados e beneficiários da prestação alimentar, sendo que o art. 1.697 do Código Civil só obriga aquelas pessoas ali mencionadas, quer na linha reta ou quer na linha colateral ou transversal até o segundo grau. Além disso, cumpre destacar que a obrigação colateral só se dá em último caso, observada a ordem preferencial: (i) pais e filhos; (ii) ascendentes, observado o grau de parentes mais próximo; (iii) descendentes, a começar pelos de grau imediato; e (iv) irmãos, germanos ou unilaterais.

Dessa forma, não é ocioso lembrar que o artigo 1.697, ao tratar das pessoas obrigadas a prestar alimentos, não lança nenhuma limitação de grau na linha reta, diferentemente da linha colateral ou transversal, onde fez constar que esta não irá além daquelas pessoas obrigadas até o segundo grau, o que implica dizer que os colaterais acima desse grau não têm obrigação jurídica de prestar alimentos, face à inexistência de previsão legal.

Noutra orla, embora haja ordem de preferência na prestação de alimentos, nada obsta que, no caso de ausência ou impossibilidade econômico-financeira contributiva das pessoas obrigadas na linha reta, possam os parentes de grau mais remoto, na linha colateral até o segundo grau, ser acionados para prestarem alimentos integrais ou complementares, consoante inteligência do artigo 1.698 do Código Civil.

Verdade é que, em que pese o surgimento de teses que admitem a legitimidade até o 4º grau, a obrigação alimentar dos colaterais, frente às disposições taxativas do Código Civil, se encontra cada vez mais equacionada em nosso ordenamento jurídico.

Destaca-se a observação de Silvio Rodrigues:

a tendência moderna é de impor ao Estado o dever de socorro dos necessitados, tarefa que ele se desincumbe, ou deve desincumbir-se, por meio de sua atividade assistencial. Mas, no intuito de aliviar-se desse encargo, ou na inviabilidade de cumpri-lo, o Estado o transfere, por determinação legal, aos parentes, cônjuges ou companheiro do necessitado, cada vez que aqueles possam atender a tal incumbência.

Essa transferência o Estado realizou por meio dos artigos 1694, 1695, 1696, 1697 e 1698 do Código Civil, os quais consistem em instrumentos de garantia do núcleo familiar, por meio da imposição de deveres de mútua assistência entre os parentes.
3 ASPECTOS PROCESSUAIS 

3.1 Impossibilidade do litisconsórcio em ação de alimentos entre colaterais

Segundo a lição de Luiz Fux, o litisconsórcio  “… é o fenômeno jurídico consistente na pluralidade de partes na relação processual. Em conseqüência, admite a classificação de ativo quando há vários autores; passivo quando há vários réus e misto quando a pluralidade verifica-se em ambos os pólos da relação processual”.

Tal fenômeno jurídico pode ser classificado também sob dois outros ângulos: será necessário quando não se puder dispensar a formação plúrima da relação processual mesmo se houver acordo entre as partes litigantes; e será facultativo quando a relação plúrima se formar pela vontade das partes. O litisconsórcio facultativo ainda pode ser subdividido em irrecusável e recusável, sendo que o primeiro, quando requerido pelos autores, não admite recusa dos réus e o segundo admite a rejeição dos demandados. Sob outro ângulo, o litisconsórcio será unitário ou especial, quando a decisão da causa for uniforme para todos os litisconsortes; e será não unitário ou comum, quando a decisão, embora proferida em um mesmo processo, for diferente para cada um dos litisconsortes.

O litisconsórcio está previsto nos artigos 46 e 47 do Código de Processo Civil (CPC), nos quais se percebe que a formação litisconsorcial depende do direito material em litígio.

Vejamos a literalidade dos dispositivos citados, ambos do Código de Processo Civil (CPC):

Art. 46 – Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:
I – entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;
II – os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de direito;
III – entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;
IV – ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito.
Parágrafo único – O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para resposta, que recomeça da intimação da decisão.

Art. 47 – Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.
Parágrafo único – O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar extinto o processo.

As situações elencadas no art. 46, como regra geral, sugerem um litisconsórcio facultativo, pois, segundo o próprio texto do dispositivo, as partes podem litigar conjuntamente, mas não estão forçadas a demandar daquela maneira.

Entretanto, conforme preceitua o art. 47, essas mesmas situações poderão ser objeto de litisconsórcio necessário “quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes”.

Como ensina José Roberto dos Santos Bedaque:

As diversas hipóteses em que se verificam o litisconsórcio e a intervenção de terceiros no processo refletem a existência, no plano material, de relações jurídicas mais ou menos complexas, bem como de situações distintas e do nexo entre elas existente. Os elementos do litígio são fundamentais para a configuração da pluralidade das partes. 
Bedaque11 acrescenta, ainda, que a incidência obrigatória da formação do litisconsórcio decorre de previsão legal, afirmando que o “litisconsórcio necessário é aquele em que a pluralidade de partes não apenas é admitida, mas também imposta pelo legislador”.

Deste modo, é certo que o litisconsórcio necessário não será admitido na demanda de alimentos entre colaterais, uma vez que a lei não o impõe e a natureza da relação jurídica não o requer, como veremos mais adiante (art. 1698 CC “… intentada a ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide”). Assim, o eventual litisconsórcio cabível na referida demanda seria o facultativo.

De fato, o objetivo da norma é permitir ao credor, ante a superioridade e relevância de seu interesse, a escolha de algum ou alguns dos parentes que lhe devem alimentos e que estão no mesmo grau. Pode o credor, com efeito, escolher aquele parente que tem condições melhores e evitar o direcionamento da ação contra aquele que não lhe convém, seja pelos seus poucos recursos seja pela demora processual que o litisconsórcio poderá acarretar.

Portanto, continuamos a defender o entendimento de que o litisconsórcio é facultativo, cabendo ao credor dos alimentos decidir se vai se ajuizar a ação contra todos os devedores ou não.

Aliás, caso se entenda que o litisconsórcio, em casos de pluralidade de parentes devedores de alimentos, seja necessário, haverá uma traição à vontade do legislador. Sim, o propósito do legislador é otimizar o processo pelo qual o credor pretende receber alimentos, permitindo-lhe a escolha do devedor. Acontece que, se entendido for que o litisconsórcio é necessário, teremos situações em que o credor dos alimentos será prejudicado pelo tumulto processual, como é o caso, por exemplo, de um número grande de irmãos que terá que ser acionado. E um detalhe: mesmo que o autor/credor não queira ajuizar a ação contra vários devedores, tendo em vista a demora processual daí advinda, o Juiz se verá, ainda assim, na obrigação de impor tal ampliação do pólo passivo da relação processual, eis que isto lhe impõe o art. 47 par. único CPC.

A jurisprudência do STJ, todavia, admite a existência do litisconsórcio necessário no pólo passivo. Com efeito, em decisão da relatoria do Min. João Otávio de Noronha restou entendido que “não obstante se possa  inferir  do  texto  do  art.  1.698  do  CC  –  norma  de natureza  especial  –  que  o  credor  de  alimentos  detém  a  faculdade  de  ajuizar  ação apenas contra um dos coobrigados, não há óbice legal a que o demandado exponha, circunstanciadamente,  a  arguição  de  não  ser  o  único  devedor  e,  por  conseguinte,adote a iniciativa de chamamento de outro potencial devedor para integrar a lide”12.

Tal orientação do Colendo Superior Tribunal de Justiça não é recente. Em decisão anteriormente citada, o ilustre Ministro Fernando Gonçalves já adotava o entendimento, fulcrado na existência de litisconsórcio necessário, de que “o demandado (…) terá direito de chamar ao processo os co-responsáveis da obrigação alimentar, caso  não  consiga  suportar sozinho o encargo, para que se defina quanto caberá a cada um contribuir de acordo com as suas possibilidades financeiras”13 .

Com a devida vênia ao entendimento acima transcrito, parece-nos ser oportuno um reexame sobre o tema, pois haverá casos em que a adoção da tese do litisconsórcio necessário extravasará o campo meramente acadêmico, podendo trazer graves e concretos prejuízos àquele que é, por razões óbvias, objeto de proteção especial do legislador (o credor dos alimentos).

Desse modo, na nossa ótica inexiste a figura do litisconsórcio necessário, em casos de pluralidade de devedores de alimentos. Há, isto sim, um litisconsórcio facultativo, a ser requerido pelo autor da ação, caso seja de seu interesse trazer ao processo todos os devedores, a fim de que o Juiz anteveja as condições de cada um e fixe a verba alimentar em face desta sua avaliação.

3.2 Modalidades de intervenção de terceiro

O nosso CPC elenca quatro espécies de intervenção de terceiros, a oposição (art. 56), a nomeação à autoria (art. 62), a denunciação da lide (art. 70) e o chamamento ao processo (art. 77).

Caberá a oposição quando um terceiro pretende a coisa ou o direito que está sendo disputado por duas ou mais pessoas. O terceiro interfere no processo e inclui a sua pretensão, que difere das pretensões dos demandantes originários. Com isso, o terceiro agrega ao processo um novo pedido.

Já a nomeação à autoria consiste no incidente em que o mero detentor, ao ser demandado, indica o real proprietário ou possuidor da coisa em litígio, com o objetivo de transferir-lhe a posição de réu.

denunciação da lide, por sua vez, presta-se a notificar a existência de um litígio ao terceiro, bem como propor antecipadamente a ação de regresso contra quem deva reparar os prejuízos do denunciante, na eventualidade de sair vencido na ação originária.

Por outro lado, a espécie denominada chamamento ao processo é o incidente pelo qual o devedor demandado chama para integrar o mesmo processo os coobrigados pela dívida, de modo a torná-los, também, responsáveis pelo resultado do feito.

Tal instituto, no entendimento de Celso Barbi, tem por fim “favorecer o devedor que está sendo acionado, porque amplia a demanda, para permitir a condenação também dos demais devedores, além de lhe fornecer, no mesmo processo, título executivo judicial para cobrar deles aquilo que pagar”.

Por fim, em que pese ter sido tratada pela lei processual civil fora do capítulo destinado à “Intervenção de Terceiros”, é certo que o instituto da Assistência, previsto no art. 50 do CPC, é caso típico de intervenção voluntária de terceiro, uma vez que na pendência de uma causa entre outras pessoas, tendo interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, intervém no processo para prestar-lhe colaboração.

3.3 O art. 1.698 como modalidade sui generis de intervenção de terceiros

Como já foi dito, o art. 1.698 do CC, apesar de ser norma material, trouxe uma característica processual quando permitiu que, na hipótese de uma demanda de alimentos entre colaterais, o demandado tenha a faculdade de chamar as demais pessoas obrigadas a prestar alimentos para integrar a lide. Daí inferir-se que o legislador sugere uma eventual pluralidade da parte passiva.

Compete à doutrina apurar qual o procedimento apropriado para que o réu traga ao processo os demais colaterais.

Já ficou demonstrado que a lei processual civil prevê como modalidades de composição de partes plúrimas o litisconsorte, as modalidades de intervenção de terceiro e a assistência.

Como já foi aqui estudado, não há litisconsórcio necessário, a levar o magistrado a impor, na forma do art. 47 par. único do CPC, a inserção dos demais devedores na posição de

réus. O litisconsórcio entre os colaterais, em casos tais, poderá ser estabelecido, no pólo passivo, se for do interesse do autor.

A assistência não é meio processual válido para se chamar terceiros coobrigados à lide, pela simples razão de que se consubstancia em ato voluntário do assistente, “para atuar em prol de uma das partes (assistido) objetivando obter decisão jurisdicional favorável a ela e beneficiar-se dos efeitos dessa decisão”. Ou seja, o réu na ação de alimentos não tem como requerer o ingresso de terceiro coobrigado no processo, por meio da assistência.

Resta-nos, portanto, as modalidades de intervenção de terceiros.

Numa primeira análise, pode-se afirmar que não cabe na demanda de alimentos entre colaterais nenhuma das quatro hipóteses de intervenção de terceiros já referidas, pois cada uma delas guarda peculiaridades que, de uma forma ou de outra, não se coadunam com a espécie de ação ora tratada, em razão do direito material em litígio.

O autor Nelson Rosenvald, tratando da obrigação alimentícia entre colaterais, em sua obra “Direito das Famílias”, reconhece que “questão das mais intrigantes que assola o direito de família, após o advento do código civil de 2002, diz respeito a fixação da natureza do instituto criado pelo art. 1698, que permite a convocação dos demais coobrigados da obrigação alimentar”16 .

Para resolver o dilema, Rosenvald sugere que a melhor solução para a omissão do legislador seria no sentido de que “se a ação de alimentos (…) for dirigida apenas contra um dos coobrigados, poderá o autor (…), ou mesmo o réu, chamar ao processo (…) os demais co-alimentantes, através de uma modalidade especial de intervenção de terceiros, criada pelo referido dispositivo legal” (grifos nossos).

E conclui no sentido de que “trata-se, destarte, de típica e especial hipótese de intervenção de terceiros criada (sem muito cuidado, é bem verdade) pelo código civil, permitindo a convocação de um dos coobrigados à prestação alimentar que não havia sido demandado originariamente”17 (grifos nossos).

Para Rosenvald, portanto, a intervenção do terceiro coobrigado na ação de alimentos não se confunde com nenhuma das hipóteses previstas no Código de Processo Civil, possuindo características e requisitos peculiares.

É nesse sentido, também, a orientação dada pela autora Maria Berenice Dias, segundo a qual, a hipótese em exame trata-se de“intervenção de terceiros que não corresponde a qualquer dos institutos consagrados no estatuto processual” .

Quanto à natureza sui generis da modalidade de intervenção de terceiro insculpida no art. 1.698 do CC, portanto, não há divergência entre tais doutrinadores.

3.4 Ausência de solidariedade da obrigação alimentar 

É importante, para compreensão do instituto criado pelo art. 1698 do CC, que verifiquemos a questão da solidariedade, em relação à obrigação alimentar.

Isto porque o chamamento ao processo, previsto nos arts. 77 e seguintes do CPC e enfrentado nos tópicos seguintes exige, para sua incidência, a existência de “devedores solidários”.

Não é demais ressaltar o conceito de solidariedade passiva em nosso ordenamento jurídico, previsto nos arts. 264 e 265 do CC, in verbis:

Art. 264: Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda.

Art. 265: A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.

A obrigação alimentar, portanto, não se encaixa em nenhum dos dois pontos desse conceito, uma vez que cada alimentante é obrigado somente no limite de suas possibilidades e, além disso, a lei não prevê tal solidariedade.

Pelo contrário, o art. 1.696 do CC, que dispõe sobre a obrigação alimentar entre os parentes, é claro no sentido da ausência de solidariedade. Senão vejamos:

Art. 1696: O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

Vê-se, assim, que a lei civil não estabelece a obrigatoriedade de que a ação de alimentos seja promovida contra todos os ascendentes do mesmo grau e sim que a obrigação recaia em “uns em falta de outros”. O alimentando tem a opção de escolher contra quem demandar, ficando o alimentante obrigado no limite de suas possibilidades.

Neste sentido, temos a dicção do Ministro Fernando Gonçalves19, segundo a qual a “… obrigação alimentar não tem caráter de solidariedade, no sentido que ‘sendo várias pessoas obrigadas a prestar alimentos todos devem concorrer na proporção dos respectivos recursos’”.

O Ministro Humberto Gomes de Barros20 também acompanha o mesmo raciocínio quando afirma que “os avós podem ser chamados a complementar os alimentos dos netos, na ausência ou impossibilidade de o pai fazê-lo. A obrigação não é solidária”.
Ainda nesta seara, comentam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery21 que “em que pese a possibilidade de se exigirem alimentos dos avós, há de esclarecer que a obrigação é concorrente, mas não solidária”.

A lição de YUSSEF SAID CAHALI22 também ressalta “que a dívida alimentar não é solidária, mas conjunta dos obrigados”.

Washington de Barros Monteiro23, comungando deste mesmo entendimento, diz que “na hipótese de coexistirem vários parentes do mesmo grau, obrigados à prestação, não existe solidariedade. … Anote-se ainda que divisível é a obrigação”.

Conclui-se, portanto, que a obrigação alimentar é divisível e não solidária, sendo que cada parente poderá contribuir com um certo valor para os alimentos em favor do alimentando, de acordo com a sua capacidade econômica.

Todavia, não se pode deixar de ressaltar uma condição especialíssima introduzida no nosso ordenamento jurídico pela Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), que ao reconhecer especial e prioritária proteção à pessoa com idade igual ou superior a 60 anos de idade, estabeleceu em seu art. 12 uma solidariedade obrigacional na prestação alimentícia, determinando que a“obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores”. Trata-se, portanto, de única e excepcional exceção à regra geral da ausência de solidariedade na obrigação alimentar!

3.5 A possibilidade de aplicação do chamamento ao processo na hipótese do art. 1.698 CC

A esta altura dos estudos, impõe a seguinte reflexão: não há litisconsórcio necessário entre os colaterais devedores de alimentos, mas aquele que foi acionado tem a faculdade de chamar os demais (art. 1698 CC), e é preciso, portanto, que se aponte um procedimento para que tal possibilidade possa se tornar uma realidade concreta.

Parece-nos que o caminho é, valendo-nos da analogia, a utilização do procedimento próprio ao chamamento ao processo (arts. 77 a 80 CPC). A jurisprudência tem acenado com esta solução.

Eis alguns julgados neste sentido:

Alimentos. Intervenção de terceiros. Chamamento ao processo. Aplicação analógica do art. 77, III, do CPC. Interesse de que venham aos autos todos aqueles que estão em situação de igualdade na responsabilidade pelo pagamento da pensão da agravada. Chamamento dos avós maternos, via citação, para a lide. Agravo parcialmente provido.
Alimentos provisórios. Impossibilidade paterna. Dever subsidiário e complementar. Obrigação avoenga. Chamamento ao processo dos demais avós. Cabimento. Direito intertemporal. Controvérsia sobre a natureza do chamamento. Ausência de solidariedade. Interpretação dos arts. 397 do CC/1916, 1.698, 2.044 e 2.045 do CC/2002, além do art. 77 do CPC. Agravo desprovido.

AÇÃO DE ALIMENTOS. AVÓS PATERNOS. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 1.696 E 1.698 DO CÓDIGO CIVIL. CONDIÇÕES DA AÇÃO. CONFIGURADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. À inteligência dos artigos 1.696 e 1.698 do Código Civil de 2002, a Ação de Alimentos pode ser proposta somente em face de um dos parentes coobrigados. A questão relativa à existência ou não da impossibilidade da prestação de alimentos por parte dos pais, constitui matéria a ser dirimida na seara meritória, podendo ensejar a procedência ou improcedência do pedido em relação ao parente demandado, e não a extinção do processo sem resolução do mérito. Configurados os requisitos da possibilidade jurídica do pedido, do interesse de agir e da legitimidade de parte, não há que se falar em extinção do processo por ausência das condições da ação. 

Dessa maneira, à inteligência dos artigos 1696 e 1698 do Código Civil vigente, dúvida não há quanto à legitimidade da ré para figurar no pólo passivo da lide, pois avó dos autores, não exigindo, tais dispositivos, que ação seja intentada contra todos os coobrigados, que podem integrar à lide, caso deseje aquele que foi demandado, através do incidente denominado chamamento ao processo, in verbis: 
Art.1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filho, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. 
Art.1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide. (…).

O que está sendo proposto, então, é uma aplicação analógica do art. 77 III do CPC, in verbis:

Art. 77. É admissível o chamamento ao processo:

III – de todos os devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de alguns deles, parcial ou totalmente, a dívida comum.

A interpretação por analogia, aliás, é permitida em nosso ordenamento jurídico tanto na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro em seu art. 4º, que prevê que sendo a lei omissa será permitido ao juiz decidir “de acordo com a analogia, os costumes o os princípios gerais de direito”, bem como no art. 126 do CPC, segundo o qual o juiz não poderá se eximir de“sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei”, cabendo-lhe recorrer, na falta de norma legal, “à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”.

A aplicação por analogia aqui citada se justifica porque, ainda que o instituto do art. 1.698 se aproxime da hipótese de chamamento ao processo, esbarra na questão de não ser solidária a obrigação alimentar, como já foi explicado alhures, enquanto o art. 77 inc. III do CPC somente admite o chamamento ao processo “de todos os devedores solidários”.

Uma vez adotada essa solução, permitir-se-á que o colateral que for acionado sozinho traga ao processo os demais devedores, o que permitirá um equacionamento justo do conflito, com a participação de todos os interessados.

Vale dizer que é assegurada a escolha a ser feita pelo autor da ação, cabendo-lhe definir contra qual dos colaterais irá ajuizar a ação; todavia, assegura-se, de igual forma, a possibilidade daquele que foi escolhido trazer os demais devedores ao processo.

Por derradeiro, cabe dizer que, se o objetivo do legislador é trazer os coobrigados ao processo, é evidente que a sentença a todos atingirá, formando título judicial contra os que forem condenados à prestação alimentar. Ao dizer que os demais coobrigados serão chamados “a integrar a lide” (art. 1698 CC), o legislador deixou claro querer que eles sejam atingidos pela sentença, que se constituirá em título executivo contra os mesmos.

4 CONCLUSÃO

A obrigação alimentar entre os colaterais, na forma do art. 1697 CC, só pode alcançar os parentes de 2º grau (irmãos).

Em que pese a jurisprudência ter encontrado uma solução para processar a demanda de alimentos entre colaterais, a hipótese contemplada no Código Civil para chamar os coobrigados à prestação de alimentos continua sendo sui generis. Isto porque, por tudo que já foi dito, o instituto criado pelo art. 1698 CC não se adapta, literalmente, às hipóteses processuais já existentes. Daí a necessidade de utilização da analogia.

Conclui-se, portanto, que o legislador, ao permitir que o demandado chame os demais coobrigados à lide, não se preocupou com o aspecto formal do instituto, mas atentou-se ao direito material das partes envolvidas, tanto do que irá receber a pensão alimentícia como daquele obrigado a pagá-la.

Neste contexto, a solução prática encontrada foi a de admitir-se, por analogia, a aplicação do instituto do chamamento ao processo, previsto nos artigos 77 a 80 do Código de Processo Civil.

 

1 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de Família. 7ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1976, p. 350.
2 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Vol. VI, 8ª ed. São Paulo/SP: Atlas, 2008, p. 347
3 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 23ª ed. São Paulo/SP: Saraiva, 2008, p. 561
4 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, vol. VI, 4ª ed. São Paulo/SP: Saraiva, 2007, p. 456.
5 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 2ª ed. Porto Alegre/RS: Livraria do Advogado, 2005, p. 460.
6 TJMG – AC nº 1.0280.09.028153-4/001 – DJ de 10/05/2011
7 CAHALI, Francisco José. Alimentos no Novo Código Civil. Disponível em: http://www.smithedantas.com.br /texto/alimentos_ncc.pdf . Acesso em: 13/06/2011
8 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 28ª ed. Atualização de Francisco José Cahali, São Paulo/SP: Saraiva, 2004, Volume VI.
9 FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 265
10 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e Processo. São Paulo: Editora Malheiros, 2004, p. 148
11 Idem, p. 153
12 Resp n° 964.866/SP –DJE 11/03/2011
13 REsp nº 658.139/RS – DJ de 13/3/2006
14 Barbi, Celso. Comentários ao Código de Processo Civil, 1ª Ed., v. I, t. II, nº 434, Rio de Janeiro: Forense, 1988, p. 359.
15 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: procedimento comum: ordinário e sumário. Tomo I. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 476.
16 ROSENVALD, Nelson; FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito das Famílias. Rio de Janeiro: Lumen Iures, 2008. Pags. 601 e 604.
17 Idem.
18 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. Pag. 444.
19 STJ – Resp n° 658.139-RS – DJE 13/03/2006
20 STJ – AgRg no REsp nº 514356/SP, DJE 18/12/2066
21 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado e Legislação Extravagante, São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2005, pág. 792
22 CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos, Editora Revista dos Tribunais, 4ª edição, pág. 146.
23MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. 23ª ed. São Paulo: Saraiva, 1985, p. 298
24 TJSP, AI nº 406109-4/2-00, Rel. Des. José Luiz Gavião de Almeida, j. 16.08.05.
25 TJRS, AC 70009724386, Rel. Des. José Carlos Teixeira Giorgis, j. 10/11/2004.
26 TJMG, AC nº 1.0042.07.018881-0/001, Rel. Des. Moreira Diniz, DJ 19/02/2010.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARBI, Celso. Comentários ao Código de Processo Civil, 1ª Ed., v. I, t. II, nº 434, Rio de Janeiro: Forense, 1988

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CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos, 3ª ed., RT, 1999, p. 704/709.

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